Wilhelm Von Humboldt

por Bruno Oliveira, Matheus Freires, Sabrina Lemos e Samuel Holanda

Wilhelm von Humboldt. Por Franz Krüger/Universidade Humboldt em Berlim. Imagem sem direitos autorais.
Wilhelm von Humboldt. Por Franz Krüger/Universidade Humboldt em Berlim. Imagem sem direitos autorais.

OBRAS

A maioria das obras de Wilhelm von Humboldt foram publicadas postumamente em alemão, sua língua materna, mas ele também chegou a escrever em espanhol e francês. Poucos textos foram traduzidas para o português. Por terem sido publicados, em sua maioria, apenas depois de sua morte, falta uma unidade entre eles, sendo sua teoria muito fragmentada por todos os seus escritos. 

BIOGRAFIA

Friedrich Wilhelm Christian Karl Ferdinand von Humboldt, mais conhecido por Wilhelm von Humboldt, nasceu na Prússia (atual Alemanha) em 22 de Junho de 1767 e morreu em 8 de Abril de 1835 aos 67 anos de idade. Filho de Alexander Georg von Humboldt (major do exército da Prússia), irmão de Alexander von Humboldt e casado com Caroline von Dacheröden, Humboldt foi um filósofo, linguista, diplomata e fundador da Universidade Humboldt de Berlim. Destacou-se por sua grande contribuição na área da linguística, mais precisamente em questões filosóficas da linguagem. Estudou direito em Frankfurt-am-Oder em meados de 1787, mas não chegou a concluir sua graduação, neste período conheceu sua esposa com quem teve 8 filhos.



1787: Sokrates und Plato über die Gottheit, über die Vorsehung und die Unsterblichkeit;
1792: Ideen zu einen Versuch, die Grenzen der Wirksamkeit des Staats zu bestimmen (Os limites da ação do estado);
1802: Ensayo sobre las lenguas del nuevo continente (América);
1810: Ueber die innere und äussere Organisation des höheren wissenschaftlichen Anstalten in Berlin;
1821: Prufung der Untersuchungen uber die Uberwohner hispaniens vermittelst der baskischen Sprache;
1822: Ueber den Dualia e uber das Entsehen der grammatischen Forme;
1823: Und ibren Eifluss auf die Ideenentwicklung;
1827: Lettre à M. Remusat sur la nature des formes grammaticales en général et sur le génie de la langue chinoise en particulier (Carta ao Sr. Rémusat sobre a natureza das formas gramaticais em geral e sobre o espírito da língua chinesa em particular);
1835: Über die Verschiedenheit des menschlichen Sprachbaues und ihren Einfluss auf die geistige Entwicklung des Menschengeschlechts (Introdução aos estudos sobre a língua kavi da ilha de Java).


CONTEXTO HISTÓRICO

Humboldt é antes de tudo um homem marcado pelo seu tempo. Na Prússia, nesse período, havia várias guerras e, por conta de toda a movimentação militar decorrente dos conflitos, os territórios acabaram se unificando, deixando a Europa com uma cara mais próxima do que conhecemos atualmente. Nesse tempo a ciência era apenas abordada pela elite, com um teor bem mais filosófico. Também ocorria nessa época a Revolução Francesa, provocando uma forte mudança na intelectualidade europeia. Humboldt viveu os movimentos formadores e o surgimento do próprio Romantismo


INFLUÊNCIA

AUTORES

Wilhelm von Humboldt sofreu influência das teorias de vários autores que vieram antes dele, dentre os quais, podem-se destacar três mais importantes: Christian Wolff, Johann Gottfried von Herder e Immanuel Kant

J.J. Engel foi responsável pelo contato de Humboldt com as teorias de Wolff, de quem ele adotou os ideais iluministas e racionalistas que no futuro estariam presentes nas suas obras tanto políticas quanto linguísticas. O contato com Herder e Kant se deu, por sua vez, através da leitura de manuais de história da linguística. De Herder, foi herdado o interesse pelas línguas orientais, em especial o sânscrito, já que ele as havia estudado. De Kant, foi herdada a busca pela explicação dos fatos "por meio de uma regularidade física e metafísica, que não busca em Deus ou em forças onipotentes as razões de sua existência" (MILANI, 2006, p. 316).



Pintura de Johann Gottfried von Herder por Anton Graff. Imagem sem direitos autorais.
Pintura de Johann Gottfried von Herder por Anton Graff. Imagem sem direitos autorais.
Pintura de Immanuel Kant por Johann Gottlieb Becker. Imagem sem direitos autorais.
Pintura de Immanuel Kant por Johann Gottlieb Becker. Imagem sem direitos autorais.

ROMANTISMO

O Romantismo foi um movimento que surgiu na Europa no fim do século XVIII e perdurou durante as primeiras décadas do século XIX. Ele instituiu, através do chamado "espírito romântico", uma perspectiva individualista e subjetiva da realidade que persegue um ideal. Isso se percebe na teoria de Humboldt na medida em que ele busca um modelo de língua perfeito, que possa permitir, de forma eficiente, que o falante expresse plenamente sua individualidade, ao mesmo tempo que faz parte de um grupo, que é definido pela unidade linguística dos falantes, onde todos são movidos juntos pelos mesmos interesses. As teorias de língua ideal, de Nação e de Espírito Nacional vêm do Romantismo e de sua característica de acreditar em ideais perfeitos.

GRAMÁTICA COMPARADA

No início do século XIX, a ideia de que todas as línguas surgiram de uma língua única estava em voga. Foi essa ideia que deu origem à Gramática Comparada. Essa, por sua vez, buscava, através da comparação das línguas entre si e com o sânscrito, a língua mais antiga de que se tinha registro na época, provar que todas elas tinham a mesma origem. Apesar de declarar improvável a existência dessa língua ancestral, Humboldt considerou o sânscrito uma língua a ser estudada e imitada por todas as outras, por ser, segundo sua visão, a que melhor ajuda o indivíduo a pensar e se expressar. 


TEORIA

Em sua obra, Humboldt tentou mostrar que a origem e evolução das línguas se relaciona diretamente ao desenvolvimento do pensamento linguístico individual e coletivo, e que a linguagem é a causa da organização social e cultural da sociedade na qual está presente, e não fruto dela. Para isso, ele estudou os componentes da língua, que, segundo sua visão, originaram-se devido a uma razão de fundo histórico. Como ponto de partida de sua obra, ele utilizou dois conceitos importantes: matéria e forma da palavra.

MATÉRIA E FORMA DA PALAVRA

A matéria da palavra é o conteúdo do pensamento do indivíduo, que é resultado das suas impressões individuais enquanto parte do grupo em que está inserido em conjunto com a herança cultural que recebeu desse mesmo grupo e da língua que fala. A forma da palavra são os conceitos resultantes da organização da matéria da palavra, os sons usados para expressá-los e de que forma eles devem ser entendidos de acordo com o contexto no qual estão presentes.

Matéria e forma não existem separados, pois juntos compõem o discurso, que nada mais é do que a maneira de comunicar-se, de materializar a língua. O discurso é definido como "forma linguística", que é, para Humboldt, "a forma na qual a língua estrutura e ordena suas palavras para dar expressão aos sentimentos" (HUMBOLDT, 1990, p. 45 apud GOMES, 2016, p. 39).


ORIGEM DAS LÍNGUAS

Humboldt estabelece que a língua expressa o espírito de quem fala, e a divide em dois tipos: individual e nacional. À medida que o tipo individual expressa o espírito particular de seus falantes, ele se instala progressivamente nos outros e, em conjunto com as características já comuns ao coletivo, a língua nacional é composta. Diante disso, "as nações são criadoras de uma língua, no sentido mais autêntico do termo". (MILANI, 2012, p. 37). Sendo assim, "a língua é todo um composto de tudo aquilo que for a história da nação; nasce do modo característico de a nação ver o mundo" (MILANI, 2012, p. 38).

"Toda língua é o mesmo mundo visto por um prisma diferente" (MILANI, 2012, p. 38), por isso, não há hierarquia das línguas. Segundo Humboldt, todas as línguas são perfeitas na medida que se abstraem da realidade e de qualquer concretude, permitindo que seu falante seja livre para o "criar-pensando" através da abstração e para manifestar seu espírito. Dessa forma, quanto mais o indivíduo pensa, mais a língua se aperfeiçoa, e esta, por sua vez, dá mais condições ao pensamento no seu exercício de criação e expressão, o que contribui para o desenvolvimento da língua, gerando, assim, um ciclo que se retroalimenta e que favorece ambos os lados.


MODELOS LINGUÍSTICOS

Humboldt estabeleceu diversos modelos linguísticos, mas destacou três como principais: aglutinante, isolante e flexionante. Esses dois últimos seriam os extremos dos sistemas linguísticos.

No modelo isolante, ocorre a separação dos conceitos linguísticos em formas que nunca se unem. Como exemplo mais perfeito desse modelo, Humboldt elegeu o chinês, onde cada forma representa uma ideia. Essa língua é o único exemplo de modelo isolante conhecido.

No modelo flexionante, as formas que representam os conceitos pré-existentes da língua podem unir-se e compor conceitos novos e mais profundos. Como exemplo mais perfeito desse modelo, Humboldt elegeu o sânscrito, cujos falantes repudiavam qualquer interferência estrangeira e procuravam estudá-lo demasiadamente, assim a língua não sofreria alterações e seria bem falada, apresentando-se mais cristalizada e mais perfeita, consequentemente ajudando seus falantes no seu "criar-pensando".

O modelo aglutinante é considerado uma espécie de modelo flexionante, podendo afirmar-se que aglutinações podem ter sido a origem das flexões numa língua. Dentre alguns exemplos de língua desse modelo, pode-se citar o alemão, o japonês e o tupi-guarani. 

NAÇÃO E ESPÍRITO NACIONAL

ENSINO DA LÍNGUA-NACIONAL

Ao mesmo tempo que a língua é dotada da característica da individualidade, pois quem a fala é um indivíduo com sua particularidades e impressões, ela também é dotada da coletividade, pois esse falantes estão encaixados em grupos, sejam eles menores ou maiores. Para Humboldt, os pequenos grupos falam uma língua específica, que se encaixa na língua-nacional, que acaba por definir a Nação, o maior grupo em que um indivíduo pode se encaixar.

Todos que participam dessa Nação possuem uma coesão nos interesses, já que os problemas de cunho nacional dirão respeito a todos os seus integrantes. Essa comunhão de interesses, regida pela língua-nacional e pelo amor à Pátria, Humboldt denomina de "Espírito Nacional", do qual os indivíduos tomam conhecimento de forma inconsciente através do estudo e aprendizagem da língua-nacional.

Ao destacar a importância da busca de bem estudar e aprender a língua-nacional, Humboldt enfatiza a importância do seu ensino de qualidade nas escolas, pois, segundo ele, pensar e falar são diretamente proporcionais, ou seja, quanto melhor se pensa, melhor se fala, e quanto mais se estuda a língua, mais capacidade tem-se de desenvolver o pensamento e a própria língua. Com isso, o indivíduo seria capaz de entender melhor as peculiaridades sociais e culturais de sua Nação, podendo inclusive modificar aquelas que não considerar boas. 

GERAÇÃO

Para Humboldt, além de os indivíduos se organizarem de forma espacial, a Nação, é necessário que existam adaptações para que o grupo sobreviva. Assim, mudanças ocorrem na língua, e os integrantes, impulsionados pelo desejo de mudar sua realidade e apesar de suas individualidades, passam a ter um comportamento comum e coletivo, constituindo, assim, uma Geração, que é a organização temporal dos indivíduos.

Cada geração é o reflexo das gerações passadas, e a herança de cada uma delas está registrada na língua. Só depois que uma geração passa, é-se capaz de medir sua importância e de perceber o que foi deixado para a geração seguinte. É através desse ciclo de renovação que a língua evolui e se torna cada vez mais perfeita, pois, ao mesmo tempo que acumula as experiências passadas da Nação, através do pensamento individual dos seus integrantes e dos seus respectivos discursos, ela muda conforme a necessidade sócio-histórica de seus falantes, acumulando novas experiências que serão por ela transmitidas às Gerações seguintes.



REVERBERAÇÃO DA TEORIA

Humboldt, com sua teoria de que a linguagem não seria apenas um instrumento acabado de expressão do pensamento, mas sim um elemento em desenvolvimento que constrói a visão de mundo dos indivíduos e os organiza em grupos, causou uma mudança de paradigma na linguística. A linguagem deixa de ser um produto, e se torna uma atividade.

Antes de sua teoria, considerava-se que a língua era determinada pela sociedade, e cabia a ela apenas o dever de descrever a realidade fielmente através da descrição, de forma rotuladora e impessoal. Humboldt quebra esse conceito, trazendo a ideia de que a língua é que forma o pensamento de seus falantes, pois é condição fundamental para que ele ocorra, e, consequentemente, acaba por organizar a realidade conforme seu prisma único, sendo a expressão do espírito do grupo a fala. Dessa forma, "nela estão depositadas as contribuições intelectuais do passado e as novas gerações podem usufruir dos benefícios que a língua oferece" (GOMES, 2016, p. 44).

Ao elaborar sua teoria, Humboldt se firmou como um grande filósofo da linguagem, e influenciou diversos outros estudiosos, como o filósofo russo Mikhail Bakhtin e o norte-americano Noam Chomsky. Além disso, criou a "gramática conteudística", que foca no conteúdo linguístico em detrimento das formas linguísticas, analisando seu valor no discurso e na formação da comunidade linguística. 

REFERÊNCIAS

GOMES, J. R. . Contribuições e Interfaces da Filosofia Linguística de Wilhelm von Humboldt. Mediação (UEG. Pires do Rio) , v. 10, p. 34-45, 2016.

MILANI, S. E. . Wilhelm von Humboldt: nascimento, filosofia e ciência. Signótica , v. v. 2, p. 309-326, 2006.
MILANI, S. E. . Humboldt e o idealismo da época. Linha d'Água , v. 21, p. 24-33, 2008.
MILANI, S. E. . Wilhelm von Humboldt e o conceito de gerações. In: II Simpósio Internacional de análise crítica do discurso, 2008, São Paulo. VIII ENIL 2007. São Paulo: USP, 2008.
MILANI, S. E. . Sobre a estrutura formal das palavras em Wilhelm von Humboldt. Revista UFG (Impresso) , v. único, p. 103-116, 2009.
MILANI, S. E. Historiografia Linguística de Wilhelm Von Humboldt: conceitos e métodos. 1. ed. Jundiaí, SP: Paco editorial, 2012. 200 v. 164 p .
RIBEIRO, Raquel A. O. da S. Romantismo: contextualização histórica e das artes. 2010. 90 p. Dissertação (Mestrado em Música) Instituto Politécnico de Castelo Branco: Escola Superior de Artes Aplicadas. Castelo Branco.
SEGATTO, Antonio Ianni . Sobre pensamento e linguagem - Wilhelm von Humboldt. Marília: Trans/Form/Ação, 2009. (Tradução/Artigo).

Universidade Federal do Ceará - Departamento de Letras Vernáculas - Introdução à Linguística - 2020
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