Família Linguística

por Elizani Estevam, João Felipe, Letícia Farias, Martins Fernando e Mateus de Moraes

Conceito geral

Site: Wikimedia. Fonte: Wikimedia Commons. Publicado: 16 de novembro de 2019.  Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Fam%C3%ADlia_lingu%C3%ADstica. Acessado em: 26 de setembro de 2020.
Site: Wikimedia. Fonte: Wikimedia Commons. Publicado: 16 de novembro de 2019. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Fam%C3%ADlia_lingu%C3%ADstica. Acessado em: 26 de setembro de 2020.

Um estudo mais aprofundado acerca da genealogia linguística começa a ser desenvolvido durante o século XIX, tomando as línguas "vivas" naquele momento como base. O método comparativo foi muito usado para a eficiência desses estudos, e por meio disso, tornou-se possível estabelecer graus de parentesco entre tais línguas, como afirma Weedwood (2002, p. 103). A descoberta do sânscrito durante o século XVII foi um ponto importantíssimo nas pesquisas e possibilitou destacar significativas semelhanças com o latim e com o grego, o que abriu espaço para expandir os estudos sobre as línguas usadas atualmente.



Aprofundamento

No século XVIII, ocorreu grande interesse pelos estudos das línguas modernas europeias. A partir disso, há estudos mais aprofundados e no século XIX surgiu o método comparativo na linguística, inicialmente com o inglês William Jones que apontou semelhanças entre o grego, o latim, o persa e o sânscrito, gerando uma hipótese sobre uma origem em comum dessas línguas. Em seguida, Friedrich von Schlegel reforça esses estudos quando compara e evidencia, pelos elementos morfológicos e fonológicos, uma semelhança entre o sânscrito, latim, grego, persa e o gótico. Em 1816, Franz Bopp desenvolve o método comparativo, mas foi Jacob Grimm que fez uma análise histórica, concluindo que as semelhanças fonéticas entre as línguas são resultados de várias transformações regulares no tempo. No ano de 1861, August Von Schleicher elabora uma gramática comparativa das línguas indo-europeias, sua análise parte da perspectiva gramatical e foi uma importante obra para os estudos histórico-linguísticos. Com o desenvolvimento de todos esses estudos da linguística comparativa, as línguas foram agrupadas em famílias, em que cada membro descende de um ancestral comum e são consideradas como organismos vivos, que podem mudar suas formas fonéticas, sintáticas e semânticas com o passar do tempo. Como exemplo dessas famílias temos as línguas latinas: Francês, Português, espanhol, Italiano e o Romeno que tem como base morfológica o Latim.


O método comparativo


O método comparativo é uma série de procedimentos que visam à reconstrução de uma língua ancestral de duas ou mais línguas. O procedimento é complexo e rigoroso, e tendo em vista uma exposição mais simples e de fácil entendimento do tema, buscar-se-á resumir o método a suas etapas mais importantes. Não há uma série de procedimentos já bem estabelecidos que todos os pesquisadores devem seguir, porém, tendo em vista uma boa fluidez do tema, irá ser usado como material de apoio o texto do linguista norte americano Lyle Campbell em linguística histórica. (CAMPBELL, Lyle. Historical Linguistics: an Introduction. Cambridge, MASS: MIT Press, 2001, pp. 108-162. Traduzido e adaptado por FINBOW, Thomas. Disponível em: file:///C:/Users/caio/Downloads/Campbell,%20Me%CC%81todo%20de%20reconstruc%CC%A7a%CC%83o%20comparada%20(1).pdf Acesso em 29 set. 2020). 

Sendo assim, como principais procedimentos do método comparativo, temos:

1- Reunir os cognatos

Deve-se reunir aquelas palavras que apresentam parentesco umas com a outras. É aconselhável que se busque comparar palavras básicas do vocabulário (como nomes de cores, partes do corpo, vegetação etc), isso porque essas palavras básicas dificilmente são emprestadas de outras línguas. Procura-se por palavras que tenham surgido a partir daquela protolíngua que procuramos reconstruir. (CAMPBELL, 1998, p. 113)

2- Reconstruir o protofonema

Nesta etapa do processo, busca-se, através de uma série de métodos, estabelecer a forma mais provável da palavra que existia quando ela ainda pertencia à protolíngua. (CAMPBELL, 1998)

2.1- A regra da direcionalidade: defende que certas mudanças sonoras dentro de uma língua são mais prováveis de acontecer do que outras, e isso acontece porque há uma regularidade ou "naturalidade" no que se refere a mudanças fonológicas. Desse modo, quando se comparam diversas palavras com o objetivo de reconstruir a forma ancestral original, tem-se que considerar uma certa probabilidade em relação à transformação que um certo som possa sofrer ao longo do tempo. (CAMPBELL, 1998)

2.2- Regra da maioria: afirma que se deve ter como prioridade de escolha aqueles sons que são os mais frequentes em um grande número de palavras. Dessa forma, se o som /b/ estiver presente com mais frequência que o som /p/ numa sequência de palavras comparadas, a prioridade será o primeiro. (CAMPBELL, 1998)

2.3- Incorporação de traços fonéticos compartilhados: procura-se por uma série regular de correspondências entre o modo e/ou lugar de articulação e o grau de vozeamento entre determinados sons. Por exemplo, supondo-se que se comparem palavras que apresentam sons de caráter velar, como /k/ e /g/, entende-se que o som reconstruído deve apresentar essas mesmas características. Por mais que outras regras indiquem um som diferente de /k/ e /g/, é aconselhável que se busque ao menos por um som de característica também velar. (CAMPBELL, 1998)

De maneira geral, estes são os dois principais procedimentos do método comparativo. Para uma melhor compreensão do tópico irão ser abordadas algumas palavras de origem latina, que é a língua ancestral das chamadas línguas românicas, tendo em vista a aplicação de alguns procedimentos do método comparativo; sendo o português, espanhol, italiano, francês e romeno as mais conhecidas. Irá se fazer uma comparação entre os nomes de cores de cada língua. Dessa forma, temos:

Português: Vermelho
Espanhol: Rojo
Italiano: Rosso
Francês: Rouge
Romeno: Rosu

Veja que o grau de similaridade das palavras é considerável, estando apenas a palavra portuguesa isolada. Neste caso, sabe-se que todas as outras línguas herdaram a forma e significado das palavras "rojo, rosso, rouge, rosu" do Latim rubeus ou russus. Perceba que o italiano e romeno fazem uso do "s" em suas palavras, o que indica que é mais provável que sua origem está na palavra russus. Importante saber também que há nessas línguas palavras cognatas em relação ao vermelho em português; no italiano temos vermiglio, no espanhol bermejo,e no francês vermelh. Ambas as palavras, incluindo vermelho obviamente, vem da palavra latina vermiculum, porém, no caso dessas palavras cognatas, seus significados apontam para um roxo.

Partindo agora para a segunda etapa do método, serão novamente apresentadas algumas palavras, dessa vez de origem persa, que representam frutas nas línguas românicas. Neste caso, temos:

Português: laranja
Espanhol: naranja
Italiano: arancia
Francês: orange
Romeno: portocale

Analogamente ao caso anterior, têm-se quatro palavras cognatas e uma isolada, que é a romena. No que se refere às outras quatro palavras, sabe-se que ambas provêm do persa narang, este vindo do sânscrito naranga. Perceba que, nas quatro palavras, pode se encontrar a partícula "ran". Em Francês, mantém-se o "g", mostrando que, por mais que à primeira vista tal palavra possa até não apresentar um grau acentuado de parentesco, ela possui, sim, sua raiz nas mesmas origens das palavras laranja e naranja, que são as mais similares em relação ao termo original. Supondo-se que não tivéssemos contato com a língua persa, e, portanto, não soubéssemos o ancestral comum de maneira direta, é muito provável que, na reconstrução do protofonema, tivéssemos a partícula "ran" (já que ele se apresenta em todas as quatro palavras) e também chegaríamos à conclusão de que essa palavra apresentaria a vogal "a" em seu início, sendo que ela se apresenta em três das quatro palavras. Prosseguindo, vê-se que todas as quatro palavras apresentam consoantes ao seu final, logo, seria correto também propor uma consoante seguida da vogal "a" no protofonema. Sendo assim, por mais que não se chegasse a uma conclusão exata, haveria sim um considerável grau de similaridade com o termo original.



Representantes


Estudiosos que criaram teorias e as aplicaram no método comparativo se fizeram presentes nesse período do século XIX. Abaixo, elencamos alguns que tiveram significativa contribuição nesse estudo: 

Elizani Estevam
Elizani Estevam
(Site: Superinteressante. Autor: Gustavo Rodrigues. Publicado: 14 de julho de 2020. Disponível em: https://super.abril.com.br/especiais/a-verdadeira-historia-dos-irmaos-grimm/ Acessado: 26 de setembro de 2020.)
(Site: Superinteressante. Autor: Gustavo Rodrigues. Publicado: 14 de julho de 2020. Disponível em: https://super.abril.com.br/especiais/a-verdadeira-historia-dos-irmaos-grimm/ Acessado: 26 de setembro de 2020.)

Nascido em 1785, em Hanau, Jacob Grimm estudou Direito, mas sua paixão se concentrava na literatura e na contação de histórias. Era também um grande estudioso de Linguística, e tinha um grande interesse em estudar a língua alemã. É conhecido mundialmente pelos seus famosos contos, produzidos junto com seu irmão Wilhelm Grimm. Jacob Grimm, em seus estudos sobre as famílias linguísticas demonstrou "na segunda edição de sua gramática comparativa do germânico, que havia diversas correspondências sistemáticas entre os sons do germânico e os sons do grego, do latim e do sânscrito em palavras de sentido semelhante". (WEEDWOOD, 2002, p. 104).


August Schleicher

Elizani Estevam
Elizani Estevam
(Minna Sundberg, creator of the webcomic "Stand Still. Stay Silent")
(Minna Sundberg, creator of the webcomic "Stand Still. Stay Silent")

Nascido em Meiningen em 19 de fevereiro de 1821, foi um linguista e botânico alemão cujo principal trabalho foi a sumarização de todas as conquistas acerca dos estudos comparativos das línguas e suas respectivas genealogias. Sua contribuição se deu na comparação entre as línguas e na formulação de teorias científicas que comparam as línguas a organismos vivos, estabelecendo correlações entre a linguística e as ciências naturais. Schleicher dizia, segundo Leroy (1967, p. 34) "que as línguas são organismos naturais e, como tal, nascem, crescem, se desenvolvem, envelhecem e morrem." Essa ideia faz uma alusão principal à teoria evolucionista de Charles Darwin.


Franz Bopp

Elizani Estevam
Elizani Estevam
(Sânscrito. Site: https://conceitos.com. Autor: Editorial Conceitos. Publicado: 21/07/2018.Disponível em: https://conceitos.com/sanscrito/Sao Paulo, Brasil. Acessado em: 26 de setembro de 2020).
(Sânscrito. Site: https://conceitos.com. Autor: Editorial Conceitos. Publicado: 21/07/2018.Disponível em: https://conceitos.com/sanscrito/Sao Paulo, Brasil. Acessado em: 26 de setembro de 2020).

Filólogo alemão nascido em Mainz, é considerado o fundador da linguística comparativa e estabeleceu a importância do estudo sobre o sânscrito para as línguas indo-europeias. Dedicava-se também ao estudo das línguas orientais, tentando estabelecer comparações e uma origem comum entre sânscrito, persa, grego, latim e alemão, chegando até a publicar uma gramática do sânscrito em 1827. Petter (2002, p. 12) salienta que "a publicação, em 1816, de sua obra sobre o sistema de conjugação do sânscrito, comparado ao grego, ao latim, ao persa e ao germânico é considerada o marco do surgimento da linguística histórica".


Estabeleceu um vínculo entre línguas nacionais e caráter nacional e formulou estudos acerca das formas "interna" e "externa" da língua. Segundo Leroy (1967, p. 47):


Elizani Estevam
Elizani Estevam
(Proto-indo-european. Site: https://fuiobrigada.wordpress.com. Autor: Fuiobrigada Publicado em: 08/10/2013. Disponível em : https://fuiobrigada.files.wordpress.com/2013/10/indoeuropes.jpg).
(Proto-indo-european. Site: https://fuiobrigada.wordpress.com. Autor: Fuiobrigada Publicado em: 08/10/2013. Disponível em : https://fuiobrigada.files.wordpress.com/2013/10/indoeuropes.jpg).

a linguagem é o órgão criador do pensamento [...]. Acreditava que a forma interna da linguagem [...] é um constituinte fundamental do espírito humano e que cada forma da linguagem pode pois ser considerada como uma caracterização do povo que a fala [...] acalentava a esperança de poder colocar a mentalidade e a língua de um povo em relação tão íntima que bastaria que uma fosse dada para que se pudesse deduzir a outra. Havia nisso um esboço de uma psicologia das raças cujas consequências Humboldt certamente não previra; sabe-se como essa concepção de uma estreita relação entre a raça e a língua resvalou insensivelmente do terreno científico [...] para o terreno de uma filosofia da História assaz nebulosa, quando o Conde de Gobineau dela fez um dos fatores de sua não célebre "desigualdade das raças", para rebaixar-se enfim ao papel de justificação pseudocientífica das criminosas teorias racistas da Alemanha nazista.


Links para aprofundamento:


Referências bibliográficas:


https://www.infoescola.com/biografias/irmaos-grimm/

https://www.greelane.com/pt/humanidades/ingl%C3%AAs/what-is-grimms-law-1690827/

https://www.britannica.com/biography/August-Schleicher

https://brasilescola.uol.com.br/biografia/franz-bopp.htm

https://www.cepad.net.br/linguisticaelinguagem/EDICOES/09/Arquivos/07.pdf

https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4409949/mod_resource/content/0/Campbell%2C%20Me%CC%81todo%20de%20reconstruc%CC%A7a%CC%83o%20comparada.pdf

https://www.webartigos.com/artigos/a-confrontacao-de-ideias-entre-os-linguistas-franz-bopp-e-jacob-grimm-e-sua-importancia-para-a-ciencia-linguistica/66691#:~:text=Embora%20Franz%20Bopp%20tenha%20desenvolvido,de%20muta%C3%A7%C3%B5es%20regulares%20no%20tempo.

https://files.cercomp.ufg.br/weby/up/156/o/Book_Aspectos_Historico-linguisticos_21-11.pdf

https://pt.slideshare.net/edsonsousajr/historia-dos-estudos-linguisticos

https://slideplayer.com.br/slide/10637824/

https://pt.slideshare.net/louiclaude/lxico-de-famlia-do-indo-europeu

https://fuiobrigada.wordpress.com/2013/10/18/linha-do-tempo-com-os-principais-momentos-e-correntes-teoricas-da-linguistica-historica/

https://www.dw.com/pt-br/wilhelm-von-humboldt-e-a-revolu%C3%A7%C3%A3o-da-educa%C3%A7%C3%A3o/a-39366493

file:///C:/Users/caio/Downloads/Campbell,%20Me%CC%81todo%20de%20reconstruc%CC%A7a%CC%83o%20comparada%20(1).pdf

https://linguopedia.webnode.com/humboldt/

https://linguopedia.webnode.com/grimm/

https://conceitos.com


- LEROY, Maurice. As grandes orientações da lingüística moderna. São Paulo: Cultrix,

1974.

- PETTER, Margarida. Linguagem, língua, lingüística. In: FIORIN, José Luiz (org.).

Introdução à lingüística: I. Objetos teóricos. São Paulo: Contexto, 2002.

- WEEDWOOD, Bárbara. História concisa da lingüística. Trad. Marcos Bagno. São

Paulo: Parábola Editorial, 2002.



Universidade Federal do Ceará - Departamento de Letras Vernáculas - Introdução à Linguística - 2020
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